Ou isto ou aquilo

Ou isto ou aquilo (Cecília Meireles)

Ou se tem chuva e não se tem sol,
ou se tem sol e não se tem chuva!

Ou se calça a luva e não se põe o anel,
ou se põe o anel e não se calça a luva!

Quem sobe nos ares não fica no chão,
quem fica no chão não sobe nos ares.

É uma grande pena que não se possa
estar ao mesmo tempo nos dois lugares!

Ou guardo o dinheiro e não compro o doce,
ou compro o doce e gasto o dinheiro.

Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo...
e vivo escolhendo o dia inteiro!

Não sei se brinco, não sei se estudo,
se saio correndo ou fico tranqüilo.

Mas não consegui entender ainda
qual é melhor: se é isto ou aquilo.

Esse poema me persegue desde que eu estava no primário (sim, eu sou do tempo do primário!!!). Me lembro de que qdo aprendi a ler eu lia tudo que eu visse pela frente: outdoors, placas, postes. Um dia minha mãe me deu um tapa na boca pq eu comecei a ler uma palavra que estava escrito no banco da Santa Casa. Só fui entender o motivo do tapa anos depois, qdo meu vocabulário de palavrões começou a ser aperfeiçoar. O que eu mais lia era o livro da escola, que eu lia inteiro, em voz alta, várias vezes, pelo simples prazer de ler, ou talvez pela alegria de saber o que aquelas palavras queriam dizer.

Não sei bem em qual série, acho que era segunda, eu sempre lia o livro todo e no meio do caminho tinha esse poema da Cecília Meireles. Se eu fechar os olhos, ainda é possível visualizar isso, eu sentada na minha cama, lendo em voz alta, fazendo gestos, balançando a cabeça de um lado pra outro: ou isto, ou aquilo... E por vezes tb fiz a minha própria lista, tentando contrapor as ideias como fez a Cecília.

Hj exercito esse poema quase todos os dias. Sem os gestos, sem leitura, sem nem lembrar dos versos da escritora. Pela direita ou pela esquerda, de metrô de ônibus, de ônibus ou a pé, um doce ou uma fruta. E quem me dera que todos os meus “ou isto ou aquilo” se resumissem a decisões cotidianas tão simplórias quatro essas.

Estou vivendo dias de “ou isto ou aquilo” bastante atormentadores. O grande impasse de se decidir por uma ou outra coisa é aquela duvidazinha, aquele quêzinho de incerteza e até de pesar. Em parte, isso se deve à frustração de não sabermos se fizemos a melhor escolha; e em parte, por não podermos ter e ser tudo ao mesmo tempo, chuva e sol, chão e céus. 

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